O que é a síndrome de Münchhausen? 8 respostas sobre as pessoas que fingem sintomas e provocam doenças a si próprias

 

O que é a síndrome de Münchhausen? 8 respostas sobre as pessoas que fingem sintomas e provocam doenças a si próprias© Getty Images


O que é a síndrome de Münchhausen?

É o nome pelo qual é geralmente conhecida uma doença grave e complexa, chamada perturbação factícia imposta ao próprio. É uma doença mental que se caracteriza pelo facto de o paciente, de forma consciente e intencional, fingir ou causar a si próprio lesões, sintomas ou doenças, sem qualquer outro interesse que não o de obter atenção e cuidados médicos.

Quais são os sintomas ou doenças mais frequentemente simuladas?

A médica psiquiatra Liliana Correia de Castro, do Hospital de Magalhães Lemos (Unidade Local de Saúde de Santo António), diz que praticamente qualquer sintoma ou doença pode ser simulado, mas que a literatura científica identifica estes como mais comuns:

  • dor abdominal;
  • dor nas articulações;
  • dor no peito;
  • distúrbios da coagulação sanguínea (coagulopatia);
  • hipertiroidismo;
  • diarreia e vómitos;
  • sangue na urina (hematúria);
  • infeções, convulsões e feridas na pele que não cicatrizam.

A médica acrescenta ainda que os doentes com esta perturbação, além de fingirem sintomas e doenças médicas gerais, podem também simular doenças psiquiátricas, sendo que, nesse caso, as perturbações mais frequentemente simuladas são o luto, a depressão, a psicose e a ideação e/ou comportamento suicida.

E como é que as pessoas fingem estes sintomas e doenças?

De várias formas. De acordo com a psiquiatra e professora auxiliar convidada no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, os doentes podem optar por uma ou várias das seguintes estratégias:

  • Inventar ou exagerar sintomas e/ou um historial médico, ou seja, queixando-se de sintomas ou doenças que não têm nem nunca tiveram;
  • Induzir os sintomas ou doenças, “ingerindo ou injetando medicamentos como anticoagulantes, insulina, laxantes ou hormonas da tireóide, aplicando ou injetando contaminantes ou retardando a cicatrização de feridas através de auto-contaminação”;
  • Agravar uma doença já existente ao não seguir as recomendações médicas, como “desencadear convulsões ao não tomar a medicação prescrita”;
  • Apresentar sintomas benignos como se não o fossem, “por exemplo, um paciente com uma pupila congenitamente contraída queixar-se de traumatismo craniano”;
  • Adulteração de testes ou amostras de laboratório e falsificação de registos médicos;

Frequentemente estes doentes vão a vários hospitais e médicos diferentes, de forma a não serem desmascarados. Além disso, a psiquiatra refere que “podem explorar o receio dos médicos de não ter conhecimento de uma doença rara e potencialmente fatal ou aproveitar o fascínio do clínico pela resolução de um mistério médico”.

Porque é que estas pessoas causam sintomas e doenças a si próprias?

Ao contrário de outras perturbações ou tipos de simulação, as pessoas com síndrome de Münchhausen não fingem para obter nenhum tipo de proveito financeiro ou prático, como não ir trabalhar, receber uma indemnização, obter receitas médicas ou mesmo para ter benefícios ou atenuantes num processo judicial.

Neste caso, os benefícios que os doentes sentem que retiram deste comportamento, explica Liliana Correia de Castro, “incluem um papel claro e um sentido de importância e pertença, bem como a preocupação e a aceitação por parte dos outros” A médica refere que um estudo dos comentários publicados por membros de grupos de apoio revelou que “receber afeto era a motivação mais frequentemente citada para ocupar o papel de doente”.

Quais são as causas da doença?

Em rigor, são desconhecidas, mas estão associadas sobretudo a fatores psicossociais que incluem “perdas precoces por morte, doença ou abandono, perturbações nas relações com os outros devido a negligência, abuso, institucionalização ou outros traumas, experiências gratificantes relacionadas com o papel de doente e um desejo de atenção”.

Há alguns relatos de doentes que apresentam alterações em algumas áreas cerebrais — comprovadas por ressonância magnética —, mas não é claro se são causa ou consequência da doença.

Quem é mais atingido por esta perturbação?

O início da doença ocorre geralmente na terceira ou quarta década de vida, “frequentemente após uma hospitalização devido a uma doença médica geral ou a uma perturbação mental e é mais frequente em pessoas do género feminino, solteiras, profissionais de saúde (passados ou atuais), indivíduos com antecedentes psiquiátricos, pessoas que estão a passar por conflitos familiares (por exemplo, abuso ou divórcio dos pais) (…), história relatada de trauma e história psiquiátrica familiar”.

A prevalência da perturbação é difícil de estimar, já que os doentes negam frequentemente a doença e tendem a ir a diferentes hospitais, clínicas e médicos, de forma a não haver conhecimento num sítio das queixas ou exames que já fizeram num outro. A prevalência varia muito entre diferentes estudos, com valores que variam entre cerca de 0,1% (como apontou um estudo realizado em Itália na população em geral) e 9% (num estudo com pacientes com febre de origem desconhecida).

Quais são as consequências desta doença para o doente? 

A gravidade da doença varia de ligeira a muito grave, pelo que as consequências também podem ser mais ou menos severas. Envolve sempre algum grau de sofrimento psicológico que estes comportamentos tentam minimizar,  implica muitas vezes uma perturbação da vida familiar e profissional, com disfuncionalidade em casa e faltas ao trabalho.

Nos entanto, nos casos mais graves, pode ter consequências na saúde física das pessoas, aumentando o risco de doença e mortalidade, seja pelos sintomas ou lesões que causam a si próprias, seja pelas consequências dos tratamentos desnecessários e exames invasivos que realizam.

Que opções de tratamento estão disponíveis?

Um dos grandes problemas desta doença é ser muito difícil que o paciente a admita e adira ao tratamento. Alguns estudos mostram que os medicamentos — como antidepressivos ou antipsicóticos — não são benéficos para a perturbação factícia em si, mas quando os pacientes também têm outras perturbações, como ansiedade, depressão ou psicose podem ser úteis nesses tratamentos.

Assim, o tratamento padrão é psicoterapia, apesar de ser difícil envolver os doentes no tratamento.

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